A Alma Hebraica do Salmo 10


O Salmo 10 começa com uma pergunta que atravessa os séculos e ainda ressoa no coração humano:

“Por que, Senhor, permaneces longe? Por que Te escondes em tempos de angústia?” (Salmo 10:1)

Essas palavras rompem o silêncio que todo crente já experimentou — aquele momento em que Deus parece distante, quando a injustiça prospera, quando a oração parece não alcançar o céu.
Em hebraico, o salmo se inicia com a frase “Lamah Adonai ta‘amod berachok?” (לָמָה יְהוָה תַּעֲמֹד בְּרָחוֹק) — um clamor que nasce da fé e ousa lutar com o próprio Deus.

O salmista não fala com formalidade religiosa, mas com dor genuína. Ele observa o ímpio triunfar e o inocente sofrer, e grita diante do aparente silêncio divino. No verso 1, ele usa o termo nis'tar (נִסְתָּר) — “oculto” — para expressar essa sensação de afastamento.
Mas esse “ocultar-se” não significa ausência. Na mente hebraica, trata-se do conceito de hester panim (הֶסְתֵּר פָּנִים) — “a ocultação do rosto de Deus”. É o mistério de quando o Eterno se esconde, não por abandono, mas para ensinar a fé a caminhar sem muletas. O silêncio de Deus se torna o campo onde a confiança amadurece.

Ainda assim, o salmo não termina em desespero. Ele se transforma. O mesmo coração que começou perguntando “por quê?” termina proclamando:
“O Senhor é Rei para todo o sempre; da Sua terra desapareceram as nações.” (Salmo 10:16)

Aqui, o salmista reafirma a malchut Adonai (מַלְכוּת יְהוָה) — o reinado eterno de Deus, inabalável mesmo quando o mundo parece em ruínas.
O caos não destrona o Rei. Pelo contrário, revela a constância de Seu trono.

E então, vem a ternura da promessa:
“Tu, Senhor, ouves o desejo dos humildes; fortaleces-lhes o coração e lhes inclinas o ouvido.” (Salmo 10:17)

A palavra hebraica para “humildes” é anavim (עֲנָוִים) — aqueles que se curvam diante de Deus, não por fraqueza, mas por reverência. São os que aprendem que a força espiritual nasce da entrega.
Suas orações sobem do pó, mas o céu se inclina para ouvi-las.

Lido com olhos hebraicos, o Salmo 10 não é apenas uma queixa — é um caminho espiritual.
Vai da angústia ao amadurecimento, do clamor à confiança, da dor à emunah (אֱמוּנָה) — fé firme e duradoura.

Essa é a jornada da alma que aprende a confiar mesmo quando não vê.
O aparente silêncio de Deus é o espaço onde Ele molda o coração do justo, preparando a resposta antes mesmo que os olhos a vejam.

Selah (סֶלָה) — pause, respire, e deixe a verdade penetrar:
Mesmo quando Deus parece distante, Ele já está agindo de perto, tecendo a redenção no invisível.

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